Eu sempre estudei em escolas públicas. Municipais e Estaduais. Em uma cidade ou em outra. Sempre. Minha família nunca teve dinheiro pra pagar o melhor colégio da cidade – e eu bem achava melhor continuar no ensino público do que pagar uma instituição meia boca. Na escola pública, pelo menos eu me virava. Passei perrengue, chorei demais. Tive que estudar nos horários que odiava – à noite. E conviver com muitos colegas de sala que, conformados, não buscavam reverter a situação – fatalistas. Eu desanimei várias vezes. Porque é INJUSTO. Desigual. Chego à dizer: DESUMANO. As condições de trabalho dos professores, a qualidade de muitos deles, as instalações, as carteiras, o material, a falta de material, a bagunça, a falta de tempo, matérias incompletas, matérias nem dadas. Tive e tenho alguns amigos que eram de escolas particulares. Eu os invejava – muito. A preparação que tinham, as muitas horas de estudos, aulas à tarde, aos sábados. E eles, muitas vezes ainda reclamavam! Eu pensava: Seu tolo, como eu queria estar no seu lugar. Sempre pegava no pé de todos os meus professores, correndo atrás de matérias extras, de ajudas por fora. Sempre estudando em casa o que não era dado na sala de aula, por falta de tempo e, também, de interesse dos próprios alunos. Mas, por fim, eu passei no vestibular. Sim, a cota. Sistema de cotas. Obrigada.
Já fui ''zoada'' por pessoas que tiveram oportunidades diferentes de mim, pelo fato de ser cotista. É, claro. Pessoas que não lêem jornais, e só usam a internet para ter dois perfis no orkut. (Porém, ainda acho que não se precisa de muito para compreender a completa incapacidade educacional, hoje, no Brasil). Que vivem na realidade paralela de um mundo bonito, e, acreditam que todas as pessoas são felizes. Se o estudante de escola pública não tivesse o benefício da cota – atenção – praticamente NENHUM estaria FAZENDO FACULDADE. Eu disse: NENHUM. Sim, porque boa parte de quem estuda em escola pública ainda tem que trabalhar para complementar a renda em casa ou para si. Eu sei, porque convivi com isso por três anos da minha vida. Eu tive o privilégio de não precisar trabalhar, apenas estudei (Se pra vce isso é um absurdo, acredite, é completamente NORMAL no meu mundo, já que muitos pais - até em ano de vestibular – preferem que o filho trabalhe, já que por mais que consiga passar em alguma prova, não terá recursos para continuar. O estudo modifica o homem, e a falta de conhecimento o impede de enxergar além, portanto este é um sistema vicioso: os pais não tiveram chances, os filhos não tem chances e os netos não terão). As pessoas não tem as mesmas oportunidades. Não neste país, não neste mundo. Muitos querem – mas lhe faltam caminhos. E outros, bem – caem no sistema e se conformam em terminar o segundo grau. Sem mais. Assim como na escola de quem paga para ter aulas, nós também pagamos. Pagamos com nossos impostos, trabalhamos três meses de cada ano só para pagar estes tais impostos (Jura que vce não sabia disso?). Que, obviamente, não são investidos para este fim. Não tenho vergonha nenhuma de sair de uma escola pública,e, muito menos de ter entrado pela cota. Porque enquanto uns tinham oito horas de aulas por dia, eu tinha duas horas e meia. Enquanto muitos tinham quatorze – ou mais – professores, eu tinha apenas cinco. E tais diferenças, não me fazem, melhor ou pior do que ninguém..e nunca farão. Eu ainda agradeço por, pelo menos, ter tido estas poucas horas e estes poucos professores - pelos quais eu sou grata. Porque a realidade no nosso Brasil – e na maioria dos países subdesenvolvidos – é essa. De abandono, inércia. Sou capaz de contar nos dedos quantas pessoas, de todo os últimos anos do ensino médio na minha escola, fizeram vestibular e hoje estão na faculdade – ou tentando entrar. E isso me entristece. E ainda, nem preciso de uma mão inteira pra saber quantos deles conseguiram entrar em faculdades federais. E eu tenho medo, porque a maioria deles não terá mais outra oportunidade – se é, que um dia ela os foi ofertada. Portanto, eu agradeço à mim mesma. Tenho orgulho de tudo que eu passei antes daquele vestibular e dou, muito, mas muito, eu gritei: MUITO. Muito valor por ter minha vaga garantida no curso de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal de Juiz de Fora. É uma pena pensar que vou me formar e ainda sim, existirá esse mundo que eu deixei para trás. Da massa, da população, da maioria que possui o resto. Como vamos mudar o mundo se aqueles que precisam da mudança nunca chegam a alcançar o poder para conseguir muda-lá.?
Ordem e Progresso. Aonde? Ah, me lembrei. Só na bandeira.